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1) Estratégia de Investimento baseada em Fatores - Introdução e Finanças Tradicionais

Atualizado: 20 de abr. de 2023

Este artigo tem o objetivo de apresentar a estratégia de investimento sistemática baseada em fatores, denominada Factor Investing. Mais especificamente, vamos apresentar o desenvolvimento teórico que desencadeou essa estratégia, iniciando nas finanças tradicionais, com a análise técnica, ainda no século XIX, e com a análise fundamentalista, no início do século XX, passando pelas finanças modernas, após a década de 1950, chegando nas finanças comportamentais, após a década de 1970 e finalizando no Factor Investing, após os anos de 1990.



Antes de iniciar o artigo, traremos o arcabouço teórico dos autores das finanças tradicionais e modernas (abordadas nas seções 2, 3, 4 e 5), a fim de antecipar o entendimento de que, para eles, o indivíduo possuía uma racionalidade plena e que os mercados deveriam se autorregular pela livre concorrência, o que os colocaria em equilíbrio e maximizaria a utilidade dos agentes. Diferentemente dos autores das finanças comportamentais (abordadas na seção 6), que definiram os indivíduos como seres passíveis de decisões irracionais que, devido a heurísticas e vieses comportamentais, geravam ineficiências mais duradouras nos mercados e movimentos nos preços diferentes daqueles previstos pela hipótese da racionalidade.


1.1 A Economia Neoclássica

As finanças comportamentais têm sua origem na formalização da ciência econômica feita por Adam Smith no livro “Teoria dos Sentimentos Morais”, publicado em 1759. Apesar de ter estabelecido os preceitos da teoria econômica que inspirou Eugene Fama e sua teoria dos mercados perfeitos, alvo de críticas das finanças comportamentais, Smith apontava para uma análise em que as relações econômicas estão socialmente imbricadas nas relações morais, políticas e culturais, das quais não podem ser separadas. Neste sentido, conforme argumenta Steiner (2016, p.12), Smith afirmava “(...) que o comportamento interessado nos mercados se associava a um princípio de solidariedade, suporte da moralidade de uma sociedade de mercados”, bem como, anteriormente, Quesnay e os fisiocratas que já haviam tido “(...) o cuidado de explicar que a economia política era uma ciência moral e política”.


Consequentemente, podemos sustentar que há uma distância entre a concepção smithiana da ação econômica e a posterior formulação do homo economicus, ou seja, aquele que age racionalmente para minimizar seu risco e maximizar seu retorno, agente dos contemporâneos modelos estocásticos de probabilidade das finanças modernas.


De qualquer maneira, esta economia conhecida como “clássica” dá os fundamentos para as teorias econômicas que definiram o homem econômico, nascidas no interior do que ficou conhecida como “revolução marginalista”. Revolução realizada por autores como John Stuart Mill (1806-1873), Willian Stanley Jevons (1835-1882), Carl Menger (1840-1921) e Leon Walras (1843-1910), identificados de maneira geral pela história do pensamento econômico como neoclássicos, a partir da imbricação de três fontes teóricas, filosóficas e metodológicas: o individualismo metodológico, a noção positivista de ciência e a filosofia moral utilitarista, onde aumentar a utilidade das decisões é sempre o objetivo racional do ser humano.


1. AS FINANÇAS TRADICIONAIS

As finanças tradicionais têm sua origem nas ciências econômicas e seu interesse no desenvolvimento de uma teoria do valor que permita descrever a dinâmica entre a riqueza produzida e suas relações de troca, ou seja, uma teoria que explique os fundamentos da precificação de ativos em geral. Adam Smith, David Ricardo e Karl Marx consideravam que o valor de um bem ou serviço se relacionava com a quantidade de trabalho que ele demandava para ser produzido. Para os economistas da Escola Austríaca e, posteriormente, da Escola Neoclássica, o valor decorre da utilidade e da escassez de um bem ou serviço. Contudo, independentemente de qual seja o fundamento do valor para a ciência econômica, interessa para as finanças desenvolver métodos que permitam prever o valor futuro de um determinado ativo.


Uma das primeiras tentativas de se prever o valor futuro de um ativo de forma sistemática foi feita por dois jovens, Charles Dow e Edward Davis Jones, que fundaram em novembro de 1882 uma agência chamada Dow, Jones & Company. Um ano após a abertura, a agência lançou um índice que representava a média das cotações de uma cesta de empresas, em sua maioria ferroviárias, o qual ficou conhecido como índice Dow Jones.


Em 8 de julho de 1889, a agência transformou seu boletim em um jornal, assim nascia o Wall Street Journal. Nele Dow tinha uma coluna na qual fazia previsão de preços baseado nos gráficos de preços passados das ações. Após a morte de Charles Dow, ocorrida 4 de dezembro de 1902, seus admiradores reuniram suas colunas em uma publicação e formalizaram ao que hoje se conhece como análise técnica ou análise gráfica de ações.


Em termos gerais, podemos dizer que a análise técnica é uma forma de examinar a atividade do mercado por meio da observação de gráficos e indicadores, baseados em preços e volumes, com o intuito de antecipar os movimentos futuros dos preços. Ela se baseia em três premissas:


1) Os preços descontam tudo, isto é, toda informação relevante está incluída no preço;


2) Os preços se movem em tendências, pois, como a movimentação de preços reflete a interpretação e a ação dos investidores no mercado, suas atitudes têm conotações positivas, neutras ou negativas que fazem com que o comportamento dos preços acompanhe uma determinada direção;


3) A história se repete, uma vez que as movimentações do mercado são resultado da ação de uma multidão que, por vezes, toma decisões baseadas em uma lógica emocional, na qual prevalecem sentimentos como o medo e a ganância, comportamentos recorrentes que, ao longo do tempo, geram padrões que podem ser identificados e reproduzidos nos gráficos e servem como um referencial dos sentimentos prevalecentes que tendem a se repetir.


A análise técnica ou gráfica de ações ganhou enorme popularidade nas décadas subsequentes, especialmente no mercado aquecido da década de 1920, porém, foi seriamente afetada com a crise de 1929.


Após a enorme queda, não prevista, da cotação das ações na Bolsa de Nova York, homens de negócio começaram a buscar um método científico de avaliar um ativo. Benjamin Graham, que havia perdido boa parte de seu capital na Bolsa em 29, em conjunto com David Dodd, publicou em 1934 o livro “Security Analysis”, que mudou radicalmente a forma de analisar ações e estimar o preço de um ativo. Segundo os autores, o valor presente de um ativo é o resultado da soma dos fluxos de caixa futuros que esse ativo pode gerar, descontados a uma taxa de juros apropriada. A matéria-prima para projetar o valor a partir dos fluxos de caixa descontados não seriam os preços passados, como na análise gráfica, mas sim a avaliação dos fundamentos da empresa. Fundamentos esses evidenciados por elementos como a qualidade de seu balanço contábil, seus projetos de investimentos, potencialidades de mercado e perspectivas futuras.


Dessa abordagem decorre o nome análise fundamentalista ou análise de valorvalue investing. Símbolo da análise fundamentalista, Warren Buffett, afirma que leu a obra em 1940 e que ela foi fonte de inspiração para sua profícua carreira de investidor. Em 1949, Benjamin Graham publicou o livro “Investidor Inteligente”, no qual manteve o método de análise dos fundamentos, mas passou a analisar com maior atenção o setor de atuação das empresas. Obra também apreciada por Warren Buffett, que defende que o mais importante é investir em poucas empresas para conseguir acompanhar de perto seus fundamentos.


A análise fundamentalista propõe um modelo matemático que utiliza informações tanto micro, como os dados dos demonstrativos financeiros e as características da governança da empresa, quanto macro, como o contexto econômico e político, para qualificar e quantificar uma variedade de fatores e fundamentos, com base nos quais procura projetar, de forma lógica e razoável, o potencial de geração futura de valor de um determinado ativo. Com isso, é estimado o “valor intrínseco” ou “preço justo” do ativo para os diversos cenários poderão vir a ocorrer, tendo como referência o cenário em que a empresa se encontrava no momento das projeções. Embora com uma abordagem diferente, assim como também propõe a análise técnica, a análise fundamentalista tem como objetivo identificar ativos mal precificados, além de buscar se antecipar a precificações futuras da empresa dada a mudança de seus fundamentos e de suas expectativas de futuro.


Enquanto grafistas e fundamentalistas debatiam, um estudante de mestrado da Universidade de Chicago, Harry Max Markowitz, publica em março de 1952 no Journal of Finance o artigo intitulado Portfolio Selection, que afirmava que os mercados não poderiam ser previstos e que a melhor coisa que um investidor poderia fazer era ter uma carteira diversificada, que refletisse a média do mercado. Segundo Markowitz, a análise gráfica e a análise fundamentalista não trazem expectativa de rentabilidade superior à média do mercado caso seja tomado o mesmo nível de risco associado à carteira de mercado. Tanto a análise técnica e a fundamentalista - como também as finanças modernas inaugurada por Markowitz - estão sobre o mesmo arcabouço teórico da economia neoclássica. Porém, a ruptura que Markowitz faz parte do entendimento da impossibilidade de conseguir, de forma consistente, retornos acima da carteira de mercado, o que o levou a defender a diversificação, diferentemente das finanças tradicionais.


Autores:

Giovanni Barillari, CGA

Felipe Duarte, CNPI

André Cassiano, CNPI-T

Josimar de Jesus, CGA

Lucas Pellegrino, MSc



Referências bibliográficas

GRAHAM, B. “The intelligent investor”. Editora Harper Business Essentials, 1949.


_____.; DODD, D. L (1934). “Security Analysis”. Editora McGraw-Hill, 1996


MARKOWITZ, H. M. “Portfolio Selection”. The Journal of Finance Vol. 7, No. 1, pp. 77-91, March 1952


MARX, K. (1886). O Capital: Crítica da Economia Política. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 2008


RICARDO, D. (1823). Princípios de Economia Política e Tributação. Coleção Os Economistas. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1996


SMITH, A. A Riqueza das Nações (1776). Coleção Os Economistas. São Paulo: Editora Nova Cultura. 1996


______. “Teoria dos Sentimentos Morais” (1759). Editora Martins Fontes, novembro de 1999


STEINER, P. Altruísmo, Dons e Trocas Simbólicas: Abordagens sociológicas da troca. Tradução: Raquel de Almeida Prado e Lolita Sala; Revisão: Maria Chaves Jardim e Karen Artur. – São Paulo, SP : Cultura Acadêmica, 2016

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